Esse blog destina-se ao registro de acontecimentos da família Caffé além de coisas do cotidiano, diversão, arte, reflexão, passeios, música e tudo que chamar a nossa atenção.



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quarta-feira, 5 de dezembro de 2012


De onde surgem os amores
Martha Medeiros


Uma amiga na casa dos 50 estava solteira há anos. Já tinha perdido a esperança de encontrar um novo namorado, e tampouco se sentia ansiosa por causa disso. Havia casado duas vezes, tinha um filho bacana e podia muito bem viver sem amor, essas mentiras que a gente conta pra nós mesmos. De qualquer forma, pra não perder o hábito, saía de vez em quando à noite, ia pra balada, se produzia bonitinha, vá que... Mas voltava invariavelmente sozinha pra casa. Até que um ex-paquera do tempo que ela era uma debutante enviou um e-mail – ele, depois de muitos anos morando no exterior, voltaria para o Brasil e gostaria de revê-la. Milagre by Facebook.

Ela disse claro, imagina, vai ser ótimo, mas não sabia quando exatamente a promessa desembarcaria no Galeão. Seguindo sua vida, foi para a piscina do clube num sábado de manhã e lá, estando bem acima do peso, suada e com um biquíni do tempo das cavernas, num daqueles dias em que só falta a placa pendurada no pescoço dizendo “Não se aproxime”, ela escutou seu nome sendo pronunciado por uma voz aveludada. Era o dito cujo, testemunhando in loco no que a debutante havia se transformado depois de tantos anos. Ela pensou na hora: esse cara vai sair em disparada. Ele pensou na hora: não desgrudo mais dessa mulher. E assim foi. Certa de que só com dieta, grife e escova atrairia olhares, ela conquistou um guapo no momento em que menos se sentia atraente.

Outra história. Atriz, loira, linda, olhos verdes, leva um fora do namorado. Passa dias com olheiras e inchaços de tanto chorar. Deprê em estágio avançado. A família organiza um almoço do tipo italiano, aberto ao público. Ela vai entupida de ansiolíticos e lá encontra um antigo conhecido com quem brincava na infância. Ele, recém separado, mas inteiro. Ela, recém separada, mas um trapo. Ficaram ali conversando, ela lamentando seu destino, desabafando sobre sua má sorte, quando, em meio a soluços, a mulher se engasga. Mas engasga feio. Engasga de quase morrer. Um vexame. Pelo menos uns 10 parentes vieram esmurrar suas costas, e a coitada vertendo lágrimas sem conseguir respirar, roxa como uma berinjela, já encomendando a alma. Ela me conta: naquele dia eu havia saído de casa me sentindo horrorosa, e aquele engasgo piorou ainda mais a situação, eu parecia o demo convulsionando. Mas o amiguinho de infância não teve essa impressão. No dia seguinte telefonou para saber como ela estava passando, e estão casados há 15 anos.

Mais uma: depois de 21 anos de uma relação muito bem vivida, veio a separação amigável. Porém, mesmo sendo amigável, nunca é fácil sair de um casamento, ainda mais de um casamento que não era um inferno, apenas havia acabado por excesso de amizade. Ela pensou: acabou, agora é a hora do luto, normal, um recolhimento me fará bem. Não deu uma semana e um estranho tocou o número do seu apartamento no porteiro eletrônico. Ela não reconheceu a voz, o nome, não sabia quem era, e não deu trela. Ele tentou outra vez no dia seguinte: ela tampouco abriu a porta, achou que o cara havia se enganado de prédio. No terceiro dia, ela resolveu esclarecer pessoalmente o equívoco. Desceu até à portaria para convencer o insistente de que ela não era quem ele procurava. Era.

Do que se conclui: de onde muito se espera – boates, festas, bares – é que não surge nada. O amor prefere se aproximar dos distraídos.


Fonte: Jornal de Santa Catarina - 11/08/2012

2 comentários:

Regina disse...

Legal!!! A gente acha que tem que ser uma linda princesa e que o príncipe encantado vem num cavalo branco...

Amei o texto!!

Beijos!

Cristina disse...

Verdade Gina. A gente esquece que o amor vê com os olhos do coração.
Também gostei muito!!
Beijos