Esse blog destina-se ao registro de acontecimentos da família Caffé além de coisas do cotidiano, diversão, arte, reflexão, passeios, música e tudo que chamar a nossa atenção.



*-----*-----*-----*-----*-----*-----*-----*-----*-----*-----*


quinta-feira, 22 de julho de 2010

Uma linda viagem de Vapor pelo Rio São Francisco

.
O rio São Francisco sempre foi um fascínio para nós, que morávamos às suas margens, em Petrolina. Muitas e muitas histórias sobre o rio nos encantava, principalmente as contadas por nosso pai que trabalhava viajando de vapor, (gaiolas, para muitos).

Uma única vez nas férias, meu pai resolveu levar minha mãe e algumas das filhas menores para um passeio enquanto ele ia a serviço. Nesta época, os menores eram: Ivone, Cristina e Rosângela, que ainda era de braço. Ficaríamos eu, Yara e Iram na casa da nossa vó Mariquinhas em Juazeiro. Eu fiquei frustadíssima, pois estava numa posição intermediária entre os maiores: Yara e Iram e as menores, que iam viajar. Batí o pé, insisti e foi o jeito me levarem.

Que viagem maravilhosa!! Acho que eu fui a que mais curti. Tudo era novidade e éramos o xodó de todos os tripulantes e passageiros que subiam e desciam em varias cidades.

Explorávamos tudo e eu ficava horas apreciando a paisagem e imaginando-me nos lugares onde passávamos. Como seria morar aqui? Como se divertiam? Como viviam aquelas pessoas? Muitas e muitas vezes parávamos só para deixar ou pegar mercadoria e eu ficava olhando as lavadeiras na beira do rio, crianças brincando na água, e muitas vezes, quando o cais era alto, as crianças descia de barriga pela areia até cair no rio. Morria de inveja. Quando demorávamos mais, podíamos também tomar um banho no rio, e conversando com Ivone, ela me diz que lembra perfeitamente do sabonete Phebo, com que mainha nos ensaboava.

Quando estávamos chegando em uma cidade ribeirinha o vapor soava um longo apito avisando da sua chegada. Olhávamos para o cais e uma grande multidão estava lá; uns esperando para embarcar e a grande maioria apreciando, e esperando que a âncora fosse lançada, e aí os marinheiros se jogavam na água e nadavam até a margem, segurando uma grossa corda e puxavam o vapor até encostar no cais. Eles colocavam uma prancha de madeira, ligando o vapor à terra firme para que as pessoas subissem ou descessem do vapor. Aí podíamos desembarcar e passear pela cidade. Depois que embarcavam e desembarcavam todas as mercadorias, tocavam o apito três vezes, para avisar que já estava de saída.

Nestes desembarques, meu pai nos levava a vários pontos da cidade e me admirava de como ele conhecia muita gente, pois ele sempre fazia aquele mesmo percurso. Na noite em que ficávamos aportados para dormir em algumas daquelas cidades ou vilarejos, ouvíamos o barulho da sanfona tocando e eu ficava louca para ver tudo aquilo. Muitos marinheiros desciam para bebericar e dançar, e eu ficava só imaginando.

Inventávamos mil brincadeiras para passar o tempo e uma que me lembro era a da pescaria, queríamos muito imitar o que a gente via. Colocávamos todos os nossos calçados no chão da cabine, subíamos no beliche e ficávamos nos entretendo querendo pescar as sandálias e os sapatos, com o gancho do cabide amarrado em uma tira de pano. Um dia fizemos uma traquinagem: subimos no vaso sanitário, do banheiro que ficava ao fundo do vapor, e pela janela, vimos a imensa roda girando, um perigo imenso.


Um lugar também proibido para nós, era perto das caldeiras, onde o fogo era alimentado pelas lenhas que abarrotavam a frente do vapor, e faziam a grande roda mover. Era um lugar quentíssimo.

Lembro-me de um dia em que o vapor encalhou, em alguns trechos, o rio não era tão fundo, vi o esforço que todos faziam para empurrar de lá e de cá com umas imensas varas, não via nenhum de cara feia mas brincando, contando histórias e muitos passageiros apreciando o trabalho, acho que estavam todos tranqüilos porque devia ser uma coisa normal, quando o rio não estava muito cheio. Eu amei ver o vapor parado naquela areia branquinha e saber que a gente podia andar por ali. Apesar do transtorno para eles, eu amei aquele dia.

Adorava conversar com o comandante, com a tripulação e vê a entrada e saída de passageiros. Sempre fazia amizade com alguns deles e sentia quando eles iam embora.

O jantar era servido às 6 horas em ponto e nós, crianças sentávamos à mesa, às 5 horas. Achava estranhíssimo jantar à tarde. Sempre dava um jeito de estar também presente nas refeições dos adultos bisblhiotando, passando em cada mesa querendo fazer amizade com todos e ouvindo uma história daqui e outra dali, e achava interessantíssimo quando via um colocar farinha na sopa, ou jantar de colher invés do garfo e faca, Adorava tudo aquilo. Das refeições, Ivone lembra que tínhamos um lanche às 3 horas, e que ela se encantava porque vinha biscoito e doce por uma espécie de elevador de roldana, que subia da cozinha, que ficava na parte de baixo, até o convés onde fazíamos a refeição.

Muitas e muitas coisas maravilhosas poderia contar desta viagem encantada, cujo destino era Pirapora-MG: a visita a cidades de Barra, Xique Xique, a linda igreja incrustada na gruta em Bom Jesus da Lapa, lembrada por Ivone, e alguns dias que ficamos ancorados em Pirapora. Acho que a viagem de ida e volta durou todo o mês de férias.
Igreja do Bom Jesus da Lapa

Boas lembranças.
Beijos,
Grácia

8 comentários:

Cristina disse...

Que memória em Gracia!! Lembra de cada detalhe!!
Eu não lembro nada dessa viagem. Só sei que tinha uma marca de queimadura em um dos braços (não consigo mais localizar)e que mainha falou ter sido em uma caldeira do vapor. Pode ter sido nesse tempo.
Obrigada por me fazer viajar através das suas lembranças. Você não poderia ter sido deixada de fora mesmo!!
Beijos

Yolande Caffé disse...

Que maravilha!!!!!!!!!!!!
Uma história tão rica de detalhes, que eu me sentir navegando nas águas calmas do velho Chico
Parabéns Grácia pela linda história.

Regina disse...

Adorei a história, como disse Yolande, eu também me senti presente com tantos detalhes. Para quem diz que a memória é ruim...
Valeu!!!

Grácia disse...

Oi gente, que legal que vocês gostaram.
Na verdade eu comecei a escrever pensando em falar sobre os nossos banhos de rio, às 5 horas da manhã com painho, mas falando do rio me lembrei da viagem, e as coisas foram saindo, eu nem sabia que lembrava de tantas coisas.
Que venham mais lembranças!!!
Beijos
Grácia

Ivone Caffé disse...

É verdade! As lembranças daquela viagem, narrada por Grácia, me fez também lembrar de poucas coisas é verdade, pois era muito pequena mas o banho de rio que tomava nos braços de painho, ah! isso é o mais vivo em minha memória pois prá mim era o momento mais esperado.
Hoje eu sei como a gente vivia feliz e quanto amor e carinho tivemos de nossos pais! Que saudades!
bjs!

Unknown disse...

Maravilhosa !!!!!
Eu, não fui a viagem por ter ficado em segunda época, (que raiva na época) e agora finalmente pude fazer parte da familia em viagem de vapor, pela belíssima narrativa de Grácia.
Obrigado irmã!

Grácia disse...

Que legal!!
Isto é um incentivo para que todos puxem pela memória e contem suas lembranças.
Bjs

Cristina disse...

Isso mesmo, Gracia
Que puxemos pela memória para trazer para o Blog as nossas histórias pois, afinal de contas, esse não é um dos grandes motivos pelo qual ele foi criado?
Vamos lá!! Temos muita coisa prá contar.
Beijos